segunda-feira, 3 de março de 2008

Olhando o mar, sonho sem ter de quê


Olhando o mar, sonho sem ter de quê.
Nada no mar, salvo o ser mar, se vê.´
Mas de se nada ver quanto a alma sonha!
De que me servem a verdade e a fé?

Ver claro! Quantos, que fatais erramos,
Em ruas ou em estradas ou sob ramos,
Temos esta certeza e sempre e em tudo
Sonhamos e sonhamos e sonhamos.

As árvores longínquas da floresta
Parecem, por longínquas, 'star em festa.
Quanto acontece porque se não vê!
Mas do que há pouco ou não há o mesmo resta.

Se tive amores? Já não sei se os tive.
Quem ontem fui já hoje em mim não vive.
Bebe, que tudo é líquido e embriaga,
E a vida morre enquanto o ser revive.

Colhes rosas? Que colhes, se hão-de ser
Motivos coloridos de morrer?
Mas colhe rosas. Porque não colhê-las
Se te agrada e tudo é deixar de o haver?


Fernando Pessoa

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostava de ter conhecido Pessoa. Cada poema dele é algo em nós, uma historia, uma vida...nao existe um unico poema que se leia e que nao se sinta nada..palavras para que..?you know me, no one knows me..

beijola